Consta que
Tertuliano, um dos pais da igreja, fez a seguinte afirmação: “Assim como Jesus
foi crucificado entre dois ladrões, o evangelho também é sempre crucificado
entre esses dois erros”. Que erros são
esses a que Tertuliano se refere? Eu costumo chama-los de religião e irreligião; os
termos teológicos são legalismo e
antinomismo. Outra maneira de designá-los poderia ser moralismo e relativismo (ou pragmatismo).
Esses dois
erros constantemente buscam perverter a mensagem e privar-nos do poder do
evangelho. O legalismo afirma que, para sermos salvos, precisamos ter uma vida
santa e moralmente boa. O Antinomismo prega que, como já somos salvos, não
precisamos ter uma vida santa e moralmente boa.
É aqui que se
encontra a “ponta de lança” do evangelho. Uma distinção clara e bem definida
entre legalismo, antinomismo e evangelho é muitas vezes vital para que o poder
transformador do Espirito Santo opere. Se nossa pregação do evangelho deixa
transparecer, ainda que muito levemente, que “É preciso crer e viver
corretamente para ser salvo” ou “Deus ama e aceita a todos assim como são”,
descobriremos que nossa proclamação não está realizando a obra transformadora
descrita na próxima parte deste livro, a qual molda o coração e muda a
identidade. Se pregarmos somente doutrinas e éticas gerais da Escritura, não
estamos pregando o evangelho. O evangelho é boa notícia de que Deus consumou
nossa salvação por nós, por meio de Cristo, para nos levar a um relacionamento
restaurado com Ele e, por fim, destruir todos os efeitos do pecado do mundo.
Mesmo assim,
é possível argumentar que, para entender tudo isso – quem Deus é, porque
precisamos de salvação, o que Ele faz para nos salvar – precisamos conhecer os
ensinos básicos de toda a Bíblia. J. Gresham Machen, por exemplo, refere-se às
doutrinas bíblicas de Deus e do homem como os “pressupostos do evangelho”. Isso
significa que o entendimento de tópicos como Trindade, encarnação de Cristo,
pecado original e pecado em geral é indispensável. Se não entendermos, por
exemplo, que Jesus não era simplesmente um homem bom, mas também a segunda
pessoa da Trindade, ou se não entendermos o significado de “ira de Deus”, é
impossível entender o que Jesus realizou
na cruz. Não só isso, mas o Novo Testamento explica constantemente
a obra de Cristo – com o vocabulário do sacerdócio, do sacrifício e da aliança.
Em outras
palavras, não devemos simplesmente pregar a Bíblia de forma geral; devemos
pregar o Evangelho. Entretanto, se os ouvintes da mensagem não entenderem a
Bíblia de forma geral, não entenderão o evangelho. Quanto mais entendermos a
obra completa da doutrina bíblica, mais entenderemos o próprio evangelho – e
quanto mais entendermos o evangelho, mais claramente veremos que, no final de
tudo, é disso que a Bíblia trata. O Conhecimento bíblico é indispensável ao
evangelho e é, ao mesmo tempo, diferente do evangelho, mas é tão comum que
ocupe o lugar do evangelho quando este não está presente, que as pessoas
passaram a confundir sua identidade.
Retirado do
livro: Igreja Centrada, Timothy Keller – Editora Vida Nova
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