Daisy Alves Artigos
26/11/2015
Por todos os cantos a terra geme.
Seus habitantes, atônitos, pranteiam. Violência, guerra, terrorismo,
perseguições, injustiças, ódios, tramas, soberba, corrupção, ardis, fuzis,
bombas… dores.
As reações são as mais diversas:
indiferença, comoção, revolta. Os que sofrem estão abatidos com angústia de
alma, talvez uma sensação de abandono ou de desalento.
Uma pergunta é inevitável: “Até
quando, Senhor?”
Incrédulos refutam: “Será que o
Senhor está vendo? Será que Ele se importa?”
– Sim, Ele vê e também sente! Ele
conhece a aflição, ouve o clamor.
Há mais de dois mil anos Jesus
Cristo, o Filho de Deus, se fez homem – Homem de dores[1] – como bem o descreveu
Isaías, 700 anos antes da crucificação. Santo, sem pecado, viveu num mundo
deformado e conviveu com pecadores – uns de coração ensinável; outros,
legalistas, obstinados, incrédulos e opositores. Foi humilhado e tentado, porém
sem pecar. Seus sofrimentos não se restringiram às últimas horas anteriores à
morte na cruz. Ele sofreu durante toda a sua encarnação e depois morreu, mas
também ressuscitou para que tivéssemos vida e vida em abundância. Como Ele o
fez?
Primeiro dispôs-se a deixar seu
trono de glória para esvaziar-se, tomando a forma de servo[2] – Ele que é um
com o Pai. E tornou-se obediente até a morte, e morte de cruz[3].
O caminho da obediência foi para
Ele, ao mesmo tempo, um caminho de sofrimento. Ele sofreu com as repetidas
investidas de Satanás, com o ódio e a incredulidade do Seu povo, e com a
perseguição dos Seus inimigos. Visto que Ele pisou sozinho o lagar, a Sua
solidão só tinha que ser deprimente e o Seu senso de responsabilidade,
esmagador. Seu sofrimento foi um sofrimento consagrado, e cada vez mais atroz,
conforme o fim se aproximava. O sofrimento iniciado na encarnação chegou
finalmente ao clímax na passio magna (grande paixão) no fim da Sua vida. Foi
quando pesou sobre Ele toda a ira de Deus contra o pecado[4]
Inocente, se fez culpado. Autor
da vida, mas derramou sua própria vida pelos eleitos. Justo, mas crucificado
entre criminosos, como se fora um deles. Escarnecido, porém perdoador.
Jesus Cristo nasceu não apenas
para ensinar e curar. Ele teve que suportar sofrimentos escandalosamente
intensos. A Palavra testifica: “Todavia, ao Senhor agradou moê-lo, fazendo-o
enfermar…”[5].
O pecado dos primeiros pais e,
consequentemente, de toda a humanidade trouxe sobre toda a natureza um estado
de maldição e juízo. O homem tornou-se escravo do pecado, impossibilitado de
salvar a si mesmo. Deus não tinha obrigação de salvá-lo, mas Ele o fez e por
sua graça. Por um só homem veio a morte, mas o misericordioso Deus nos proveu
grande salvação.
Para cumprir cabalmente sua grandiosa
missão, Jesus nasceu em uma pequena cidade em vez de um grande centro urbano;
repousou entre animais numa estrebaria, não em um palácio; na mais tenra
infância foi considerado uma ameaça, tornando-se forasteiro no Egito. Passado o
perigo inicial, retornou a Israel e foi morar em Nazaré, que parece ter sido
uma localidade desprezada pelos judeus, a julgar pelo comentário de Natanael:
“Pode haver coisa bem vinda de Nazaré?”[6]
Tão logo atingiu a idade
pré-estabelecida por Deus, iniciou seu ministério. Mas, a partir de então, Ele
não tinha onde reclinar a cabeça. Esteve sujeito a uma série de situações
adversas: escapou das mãos dos seus opositores algumas vezes; ainda que tenha
se compadecido de multidões, foi odiado; ao fazer o bem, foi injuriado. Até
mesmo foi taxado de “peste”, “promotor de sedições entre todos os judeus, por
todo o mundo e chefe da seita dos nazarenos”[7]. Conforme predisse Isaías, Ele
de fato foi “desprezado e o mais rejeitado entre os homens”.
A cruz estava nos planos divinos
desde a eternidade, desde a nossa pré-história[8] porque, sendo onisciente,
Deus viu que o homem cairia, mas nosso misericordioso Deus não seria pego de
surpresa, antes, planejou a salvação. Para tanto, seria necessária a
voluntariedade de Jesus – Ele que é a causa, o conteúdo e a manifestação da
graça de Deus. Jesus – o Homem de dores – se fez homem para tomar o nosso lugar
e receber a punição a que nenhum homem subsistiria. Somente Ele tem os
atributos, santidade e características favoráveis para se entregar, morrer,
ressuscitar e vencer o pecado e a morte.
Ainda que tenha vivido em sua
divina humanidade entre nós, “não teve por usurpação ser igual a Deus”[9]
Renunciou aos privilégios inerentes à sua pessoa e status, ao realizar o auto
sacrifício num gesto de amor sem igual.
“F. F. Bruce interpreta
corretamente essa questão, quando escreve: Não existe a questão de Cristo
tentar arrebatar, ou apoderar-se da igualdade com Deus: ele é igual a Deus,
porque o fato de ele ser igual a Deus não é usurpação; Cristo é Deus em sua
natureza. Tampouco existe a questão de Cristo tentar reter essa igualdade pela
força. A questão fundamental é, antes, que Cristo não usou sua igualdade com
Deus como desculpa para autoafirmação, ou autopromoção; ao contrário, ele a
usou como ocasião para renunciar a todas as vantagens ou privilégios que a
divindade lhe proporcionava, como oportunidade para auto empobrecimento e auto
sacrifício sem reservas”[10].
Nós, crentes ou incrédulos, não
podemos avaliar nem mesmo minimamente o quanto Jesus sofreu durante sua
humanidade. Temos a tendência pecaminosa de sempre achar que a nossa dor é a
maior de todas, que ninguém pode entender o que passamos. Mas Jesus sabe,
porque Ele sentiu em si mesmo, tanto a dor física quanto a espiritual. E de
forma tão brutalmente intensa como ninguém.
Antes de ser preso, o Homem de
dores sentiu em sua alma uma angústia sem par e até mesmo suou sangue quando
orou no Getsêmani. “Sua pele ficou empalidecida, suas pupilas se dilataram,
seus músculos se enrijeceram e ele começou a tremer durante toda a noite”[11].
Frederick Zugibe – médico legista
e escritor – explicou o que se passou no organismo de Jesus: “o sistema
nervoso, uma vez acionado, fez o fluxo sanguíneo desviar-se das regiões
periféricas para o cérebro. Batimentos cardíacos e respiração estavam
acelerados”. Ele sabia que era apenas o começo de horas de tortura.
Logo após sua prisão foi
violentamente açoitado por soldados romanos (117 golpes, já que o chicote tinha
três pontas). As pontas do açoite tinham objetos de metal, lascas pontiagudas
de osso e lâminas que dilaceraram sua carne com possível laceração no baço e no
fígado. Nas horas seguintes “houve um vagaroso acúmulo de fluido (efusão
pleural) ao redor de seus pulmões, causando dificuldades na respiração”[12].
Pesquisadores asseveram que Jesus
– o Homem de dores – não recebeu uma coroa de espinhos, mas um capacete de
espinhos. Ramos de nervos da cabeça foram feridos, o que provocou “dores
lancinantes”. Como se não bastasse, bateram em sua cabeça com uma cana ou uma
vara, de modo que os espinhos penetraram no couro cabeludo e aumentaram a
tortura.
Na etapa seguinte da paixão,
amarraram nos ombros de Jesus Cristo a parte horizontal de sua cruz (cerca de
22 quilos) e penduraram em seu pescoço o “título” (em grego, “crucarius”),
placa com o nome e o ‘crime’ cometido. Seguiu-se então uma caminhada de cerca
de oito quilômetros. A distância percorrida até o Gólgota era particularmente
difícil devido ao escárnio, humilhação e rejeição dos espectadores que
acompanhavam a via crucis. Somente inimigos do Estado ou marginais perigosos
eram condenados à morte por crucificação. O forte calor do sol e o peso da
barra transversal nos seus ombros irritados, bem como a condição em que o Homem
de dores se encontrava após tantos traumas físicos, causaram-lhe intensa
fraqueza e tontura, de modo que ele tropeçasse e caísse.
A essa altura as vestes de Jesus
já estavam grudadas nas feridas de seu corpo, devido ao sangue coagulado
resultante do açoitamento. Evidentemente que, ao chegar ao local da
crucificação, suas vestes devem ter sido abruptamente arrancadas de seu corpo provocando
grandes surtos de dor. Os romanos eram cruéis na arte de torturar.
Crucificado, Jesus ainda suportou
mais agonia. Não podia relaxar o corpo sem sufocar. Era todo sofrimento. Não
havia parte sã na sua carne, pois “…ao Senhor agradou moê-lo, fazendo-o
enfermar…”.
No clímax desta história de
humilhação e sofrimento, Deus derramou sobre Cristo a ira que nós merecemos e
aceitou o sacrifício vicário substitutivo para que nós, os pecadores,
pudéssemos ser justificados. O clamor de Jesus Cristo ecoou no mundo para que
se confirmasse que Deus é santo e Ele não admite permanecer na presença do
pecado. Jesus se fez pecador em nosso lugar, daí a pungente exclamação: “Eloí,
Eloí, lamá, sabactani? que, traduzido, é: Deus meu, Deus meu, por que me
desamparaste?”[13] As palavras de Jesus são tiradas diretamente do Salmo 22:1,
escrito cerca de 1000 anos antes. A maior parte deste salmo é uma profecia do
sofrimento que Jesus suportaria na cruz.
Depois, sabendo Jesus que todas
as coisas já estavam consumadas, inclinando a cabeça, “entregou o
espírito”[14].
Para confirmar sua morte, um
soldado perfurou-lhe o lado. A lança feriu o átrio direito do coração de Jesus,
que teria se enchido de sangue. Uma maciça efusão pleural já se fazia presente.
O rápido e violento movimento da lança teria liberado o sangue e a água.
Na cruz, pela água e pelo sangue
vertidos, Deus deixou-nos a seguinte mensagem: Jesus nos purificou, ele é a
água da vida, seu sangue nos lavou dos pecados. E Jesus não veio apenas para
morrer em nosso lugar. Ele foi o Homem de dores, que conhece a nossa estrutura
e as nossas aflições. Mas também veio para vencer o pecado, a morte e o diabo,
através de sua morte e ressurreição.
“e havendo riscado o escrito de
dívida que havia contra nós nas suas ordenanças, o qual nos era contrário,
removeu-o do meio de nós, cravando-o na cruz; e, tendo despojado os principados
e potestades, os exibiu publicamente e deles triunfou na mesma cruz”[15]
O homem natural não entende o por
quê de tanto martírio. Somente aquele que nasceu de novo pode desfrutar e
entender a grandiosa obra da salvação.
Jesus Cristo viveu como um de
nós; foi tentado e humilhado, mas não pecou. E em sua natureza divina,
sacerdote da ordem de Melquisedeque, ofereceu a si mesmo em favor de muitos, e
sabe compadecer-se dos pecadores.
O conhecimento de Deus faz com
que possamos entender que sozinhos tudo fica muito difícil. Jesus ensinou: “Sem
mim, nada podeis fazer” (Jo. 15:5). Quanto mais nos aproximarmos de Deus, mais
forças teremos para lutar e superar as adversidades, mais coragem diante dos
sofrimentos, nossos e de outros, neste mundo tenebroso. Nossas aflições não são
grandes. Grande é o nosso Salvador.
Disse Jesus: “no mundo tereis
aflições, mas tende bom ânimo, eu venci o mundo”[16].
Martin Lloyd-Jones escreveu sobre
a crucificação de Jesus: “Saiba que não fomos nós que levamos o Filho de Deus
até a cruz. Foi o próprio Deus. Foi por seu propósito predeterminado e
presciência”[17].
“Ó profundidade das riquezas,
tanto da sabedoria, como da ciência de Deus!
Quão insondáveis são os seus
juízos, e quão inescrutáveis os seus caminhos!”[18]
O Homem de dores viu o fruto do
seu trabalho e ficou satisfeito. Nasceu, sofreu e morreu por mim e por você.
O Homem de dores triunfou! Que
verdade gloriosa! Seu túmulo está vazio. Ele vive! Podemos ter certeza: Ele é o
socorro bem presente na hora da angústia. Não tema, Ele cumpre sua promessa:
“eis que eu estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos”[19]
Glória a Deus nas maiores
alturas, e paz na terra entre os homens de boa vontade!
[1] Is 53:3
[2] Fp 2:7
[3] Fp 2:8
[4] BERKHOF, Louis. Teologia
sistemática. Tradução de Odayr Olivetti. 3. ed. São Paulo: Cultura Cristã,
2009, p. 310
[5] Is 53:10
[6] Jo 1:46
[7] Atos 24:5
[8] PARANAGUÁ, Glênio Fonseca.
Cruz credo! O credo da cruz. Londrina: IDE, 2002, p. 22
[9] Fp 2:6
[10] F. F. Bruce in
http://hernandesdiaslopes.com.br/2009/04/a-humilhacao-e-a-exaltacao-de-cristo/#.VijLB5M0O_g
[11] ZUGIBE, Frederick T. A
crucificação de Jesus: as conclusões surpreendentes sobre a morte de Cristo na
visão de um investigador criminal, 2ª ed. São Paulo: Ideia & Ação, 2008.
[12] Zugibe, p. 36
[13] Mc 15:34
[14] Jo 19:28-30
[15] Cl 2:14, 15
[16] Jo 16:33b
[17] LLOYD-JONES, Martin A
mensagem da cruz: o caminho de salvação de Deus. 1ª ed. Brasília: Palavra,
2009, p. 79
[18] Rm 11:33
[19] Mt 28:20
Daisy Alves é divorciada e mãe de
Jaqueline Aves e Arthur Alves. Aposentada como Especialista em Políticas
Públicas e Gestão Governamental do Governo do Distrito Federal. Conselheira na
equipe de conselheiros bíblicos da Sebi – Sociedade de Estudos Bíblicos
Interdisciplinares, com treinamento pelo NUTRA – Núcleo de Treinamento,
Recursos e Aconselhamento Bíblico (SP) – 2014 e pela ABCB – Associação
Brasileira de Conselheiros Bíblicos (SP) – 2012-2015.
Professora da Sebi – Sociedade de
Estudos Bíblicos Interdisciplinares; Pós-Graduação Latu Sensu em nível de
Especialização em Aconselhamento Bíblico, pela Faculdade Mauá de Brasília/Sebi
– 2013; Bacharel em Teologia pela Faculdade Faifa, Ministério Fama – 2012;
Bacharel livre em Teologia/Cum Laude, pela Associação Multiministerial Ebenézer
– 2011; Curso Intensivo de Capelania Evangélica, OCEB – Ordem dos Capelães
Evangélicos do Brasil – 2011; Inglês Instrumental para Teologia pela SEBI –
2011; Inglês nível 3A, COPLEM – Cooperativa de ensino de língua estrangeira moderna
– 2008; Oratória: A arte de falar em Público, SENAC/DF – 2008; participou do 1º
Seminário de Religião para Jornalistas e Líderes Evangélicos, na Igreja Batista
Central de Brasília – 2007; Treinamento em Estratégias de Relações Públicas
pela Secretaria de Trabalho, Emprego e Renda do DF, Instituto de
Desenvolvimento de Recursos Humanos e SENAC/DF – 2000; Instrutor de
Informática, Centro de Informática de Brasília – 1997; participou do I Fórum de
Plantas Medicinais do Distrito Federal e Entorno, Secretaria de Meio Ambiente,
Ciências e Tecnologia do Distrito Federal – 1996; participou do I Congresso
Brasileiro de Medicina e Terapias Naturais, Instituto Médico Seraphis e Nova
Acrópole do Brasil (DF) – 1994; Curso de Introdução à Homeopatia (06 h) pelo Instituto
Médico Seraphis e Nova Acrópole do Brasil (DF) – 1994; Curso de Extensão
universitária em História Afro-Brasileira, pela UNB – Universidade de Brasília
(Decanato de Extensão – Departamento de História) – 1988; Bacharel em
Comunicação Social – Jornalismo, pela Sociedade Unificada de Ensino Superior
Augusto Motta (RJ) Atual Universidade Augusto Motta – 1980; Comunicação Oral –
Ministério da Educação e Cultura – Serviço de Radiodifusão Educativa – Rádio
MEC (RJ) – 1980; Inglês nível 2 pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro –
UERJ – 1979.